Entre a imagem e a escrita: fronteiras da cena num roteiro e num vídeo
Resumo
Para Vilém Flusser, imagem é cena, que já é uma forma de codificação domundo. O mundo empírico é organizado pela imagem como cena, o que
pode nos aproximar da ideia de encenação teatral. Para Flusser, a passagem
da civilização da imagem para a escrita é a passagem do tempo cíclico para
o tempo histórico, da cena para a linha. A temporalidade sincrônica da cena
preside sua concepção de imagem, e se contrapõe à diacronia do texto. Seria
possível transpor essa ideia de uma cena da imagem para pensar a imagem
do video? Como a imagem numérica, descrita pelo próprio Flusser como
conceito transformado em imagem, pode se converter em imagem como
cena? A busca de uma encenação na imagem norteia esta investigação, na
qual a teoria é inseparável do desenvolvimento do vídeo “2.086”. O roteiro de
audiovisual representa um lugar de passagem do texto para a imagem. O
roteiro seria, nos termos de Flusser, o lugar da passagem virtual da linha para
a cena. Da história, mais abstrata, “consciência histórica”, para uma
linguagem mais concreta, dotada da magia da imagem, “consciência mágica".
Mas a cena agora não é mais a do tempo cíclico. Segundo Flusser, a imagem
numérica, ou seja, a do audiovisual contemporâneo, não é a mesma coisa
que a imagem como cena. Esta última está mais próxima das “circunstâncias
concretas”. A proposta desta investigação, que corre paralela à primeira, é
pesquisar o roteiro como lugar específico da transcodificação de texto em
imagem. O roteiro poderia representar a volta virtual da escrita à imagem ou,
pelo contrário, o avanço da imagem sobre a escrita. Esse retorno (ou
avanço), tratando-se da imagem numérica, caracterizada como “superfície
lisa”, seria antes uma retroação dupla da imagem ao texto (ou avanço duplo)
e deste à concreção mais próxima das circunstâncias concretas oferecida
pela imagem. Maneiras diferentes de atravessar múltiplas fronteiras de
espaços que se absorvem mutuamente entre imagem, escrita de imagem e
imagem de escrita de imagem. As duas investigações – no campo do roteiro
e numa obra em video –, são como linhas paralelas deste mesmo ponto do
pensamento de Flusser.
Referências
DUBOIS, Philippe. Cinema, vídeo, Godard. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
FLUSSER, Vilém. O mundo codificado: por uma filosofia do design e da
comunicação. São Paulo: Cosac Naify, 2007.
GILLIAN, Vince. BREAKING BAD: Pilot. Los Angeles: AMC, Sony Pictures
Television, 2005.
Publicado
2018-08-15
Seção
Territórios e Fronteiras da Cena