Subpartitura e Texto-dado: A Troca para a Inscrição do Impulso

  • Rejane Kasting Arruda

Resumo

Pretendo divulgar resultados obtidos em pesquisa de mestrado realizada na Universidade de São Paulo junto ao CEPECA (Centro de Pesquisa e Experimentação Cênica do Ator), coordenado pelo Prof. Dr. Armando Sergio, do qual participam atores-pesquisadores que desenvolvem processos de criação e análise, sistematização e conceitualização da prática.
Trabalhei com o texto Quarteto, de Heiner Müller, para investigar um procedimento
específico para a aproriação do texto.
A Memorização Através da Escrita foi introduzida no Brasil por atores da Instituition
Pontedera Teatro (François Khan e Caca Carvalho) através de oficinas e trabalhos com
grupos de teatro. Trata-se de repetir o registro escrito até a efetiva memorização. A vantagem é que o texto pode ser memorizado sem intenção, imagem vocal ou vínculo com qualquer outro elemento. Durante a aplicação, o ator constrói, apenas, um ritmo interno, e imagens ainda desarticuladas (repertório).
Qualquer elemento pode, então, ser introduzido no jogo de enunciação do texto, digamos assim, ainda ¨virgem¨: partituras físicas, imagens vocais (¨voz de cachorro¨, por exemplo), ritmos, etc. Utilizamos partituras de imagens, jogos tradicionais e mimesis, percebendo que, em contato com estes elementos, o texto auxiliava a construção de ações.
A conclusão do processo foi que poderíamos utilizar a Memorização Através da Escrita
também para a fixação de uma fala própria, íntima, que implicava tanto o universo da
personagem, a relação com Valmont (personagem masculino de Quarteto), quanto a minha própria relação com o processo de criação e minhas questões pessoais; uma fala me articulava ao universo ficcional e era suficientemente forte para alicerçar meu organismo, engajar meu corpo.
Descobri a possibilidade de revesar as sentenças desta fala com as do texto-dado, de maneira a ¨costurá-las acústicamente¨. Por exemplo, com a repetição do registro escrito ¨Idiota¨ (interna) e ¨Valmont¨ (texto), a imagem acústica memorizada é ¨IDJIO(TAVAU)MOUM¨ (é possível perceber o elemento de ligação entre os dois). Estando os dois elementos ligados, quando o foco se concentra em ¨Idiota¨ (que alicerça o corpo para a inscrição de ações), o ¨Valmont¨ é inscrito ¨por substituição¨, implicando, então, a produção do impulso para a fala.

Referências

BARBA, Eugenio. La Canoa di Carta: Trattato di Antropologia Teatrale. Bologna: Il Mulino, 1993.

BONFITTO, Matteu. O Ator-compositor: As Ações Físicas como Eixo: de Stanislavski `a Barba. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2007.

DOSSE, François. História do Estruturalismo. Bauru, SP: Edusc, 2007.

FERRACINI, Renato. A Arte de Não Interpretar como Poesia Corpórea do Ator. Campinas: Editora da Unicamp, 2001.

GROTOWSKI, Jerzy. Conferência a Santo Arcângelo, em julho de 1988. Transcrição e tradução de Dinah Kleve. Não publicada.

JIMENEZ, Sergio. El Evangélio de Stanislavski Segun sus Apostoles. México: Ed. Gaceta, 1990.

LACAN, Jacques. ¨A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud¨, in Escritos. Rio de Janeiro: Joge Zahar Ed, 1998.

______________. ¨As Estruturas Freudianas do Espírito¨, in Seminário V: As Formações do Inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.

KNÉBEL, Maria. La Poética de la Pedagogía Teatral. México: Ed. Siglo XXI, 2002.

______________. El Último Stanislavski. Madrid, Ed. Fundamentos: 2005.

KUSNET, Eugenio. Ator e Método. São Paulo: Hucitec, 1992.

MÜLLER, Heiner. Quatro Textos para Teatro: Mauser, Hamlet-máquina, A Missão, Quarteto. São Paulo: Hucitec, 1987.

SAUSURRE, Ferdinand. Curso de Lingüística Geral. São Paulo: Ed. Cultrix, 2006.

STANISLAVSKI, C. A Criação de um Papel. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 2005.

SPOLIN, Viola. O Jogo Teatral no Livro do Diretor. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1999.

_____________. Improvisação para o Teatro. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1979.