Presenças: um Referencial para a Formação Superior Pública do Artista Teatral

  • Alexandre Calado
  • António Januzelli

Resumo

O objeto das linhas que se seguem é a arte cênica, é o problema da formação
do artista cênico para ser mais exato. O que proponho é uma discussão sobre
a possibilidade de certa noção de presença constituir um referencial de
trabalho em situações de ensino e aprendizagem, em instituições públicas de
formação superior. As artes da cena estão de tal modo imbricadas com a ideia
de presença, que a relação entre os termos carece de uma justificação
delongada: a produção e a recepção são síncrones e coextensivas para o
espectador que se apresenta, há um espetáculo que acontece sempre no aqui
e agora da cena, é difícil não pensar logo na presença do ator, talvez mesmo a
primeira ideia que nos ocorre. É que a noção de presença persiste operante
nos discursos e no pensamento dos fazedores da cena, ela é retomada na
dança, nas artes visuais; ela parece ter ganho relevância com as
experimentações que desde a década de 70 do século passado invadem os
palcos com elementos estranhos à representação, tendo contribuído para o
aparecimento das noções de estética performativa e de teatro pós-dramático,
bem como às ideias de cena abstrata e de incursão do real. Quando se fala em
teatro e no ofício do ator, em particular, a noção de presença aparece como
uma sombra que atormenta os discursos, difícil de apreender, impossível de
afastar. O que queremos saber é se esta noção nos pode servir para pensar a
formação do artista que quer fazer teatro atuando em cena. Sustento que há
uma prevalência no uso do termo “presença” como designação de um índice de
eficácia na execução em cena, a qual compromete as liberdades e
responsabilidades do fazedor de teatro enquanto compositor de espectáculos e
agente cultural. Tomando como ponto de partida entradas do termo “presença”
em dicionários contemporâneos de língua portuguesa, teatro e filosofia, discuto
como o sentido de “presença temporal” pode contribuir para uma reflexão
emancipatória sobre a formação em artes cênicas. Acredito que o ensino
artístico superior público não pode descurar quanto as indústrias culturais dos
nossos dias exploram o desejo das massas por experiências de presença,
devendo, portanto, contribuir para a formação de artistas cuja prática seja
consciente e crítica desta realidade.

Referências

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