Uma sismografia da arte da performance na América Latina

  • Camila Bastos Bacellar Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Resumo

Podemos pensar que nossas formas de arquivar e de produzir conhecimento crítico sobre performances criadas por corpos de mulheres assim como pelos demais corpos desviantes do sistema binário heteronormativo possuem decisiva influencia no modo por meio do qual estes trabalhos entram para a história. Antes de depositário da verdade, o arquivo implica seleção, corte, decisão e eliminação. No tocante a prática da performance seria interesse buscar maneiras de escrever e arquivar que sejam mais condizentes com características que singularizam a arte da performance. Considerando que em grande medida a arte da performance problematiza e desafia o conceito de representação como compor uma escrita e uma “arquiva-ação” que sejam não só uma sismografia descritiva do contemporâneo, mas um questionamento posicionado sobre nossa sociedade atual? Seguindo as intuições da teórica Giulia Palladini (2017) um arquivo pode ser um arquivo afetivo na medida em que meu modo de encontro com os afetos disparados pelas performances esteja presente. Se distingue de outras tecnologias de arquivação justamente por ser pensado como algo que afeta aquilo que conserva. Um arquivo que transforma os materiais ao invés de conservá-los é, por consequência, a transmissão de um desejo decontinuação. É com tais implicações em mente que propõe-se aqui um uma breve sismografia da performance brasileira e latino-americana cujo interesse não está somente em tensionar o campo referencial da performance artística, localizado sobretudo no hemisfério norte, mas em contaminar-nos de trabalhos feitos em geopolíticas mais similares as pisadas pelos nossos pés. Asismografiaéaartederegistrar os abalos e movimentos ondulatórios dos terremotos. Aqui os terremotos são as açõesperformáticas realizadas por artistas latino-americanas em atividade na atualidade. Semquereratrelar as ações artísticas convocadas a uma suposta – ouverdadeira – “arte feminista latino-americana”, tratar-se-á aqui de performances que dialogam com questões feministas alinhadas a perspectivas feministas interseccionais, trans, antirracistas e descoloniais.

Biografia do Autor

Camila Bastos Bacellar, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).  Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Bacharel em Artes Cênicas/Interpretação pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. 

Referências

BACELLAR, Camila. Performance e Feminismos: diálogos para habitar o corpo- encruzilhada. In: Revista Urdimento, v. 2, n. 27, 2016. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/index.php/urdimento/article/view/8637. Acesso em junho 2017.

BARRIENDOS, Joaquín. La idea del arte latinoamericano: estudios globales de arte, geografias subalternas, regionalismos críticos. Tese (Doutorado em História da Arte) Universidade de Barcelona, Barcelona, 2013.

BERNSTEIN, Ana. Marina Abramovich: do corpo do artista ao corpo do público. In: AZEVEDO, Carlito, SUSSEKIND, Flora e DIAS, Tania (Org.) Vozes Femininas: gêneros, mediações e práticas da escrita. Rio de Janeiro: 7 letras, 2001, p. 378-402.

CARLSON, Marvin. Performance: uma introdução crítica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.

DERRIDA, Jacques. Mal de Arquivo. Uma impressão freudiana. Tradução: Claudia de Moraes Rego. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2011.

ESPINOSA, Yuderkys; GÓMEZ, Diana; OCHOA, Karina. Tejiendo de otro modo. Feminismo, epistemología y apuestas descoloniales en Abya Yala. Popayan: Editorial Universidad del Cauca, 2014.

FABIÃO, Eleonora. Performing Feminist Archives. A Research-In-Process on Latin America Performance Art. In: KNAUP, Bettina & STAMMER, Beatrice (Org.) Re.act feminism #2 – a performing archive. Londres: Verlag fur moderne Kunst Nunberg & Live Art Development Agency, 2014, p. 29 – 36.

________________. Teatro e Performance: poéticas e políticas na cena contemporânea. Sala Preta, São Paulo, v.8, 2008, p.235- 246.

_______________. History and Precariousness: in search of a performative histography. In: Perform, Repeat, Record: Live Art in History. Chicago: Intellect, The University of Chicago Press, 2012, p. 123-136.

FERES JR., João. La história del concepto “Latin America” em los Estados Unidos de América. Tradução de Flavio Alfredo Gaitán. Santander: PUblican, Ediciones de la Universidade de Cantabria, 2008.

GOLDBERG, Roselee. A arte da performance. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2006.

GOMEZ PEÑA, Guillermo. Ethno-Techno Writings on Performance, Activism and Pedagogy. Nova Iorque: Routledge, 2005.

GONZALEZ, Lélia. A categoría político-cultural de amefricanidade. In: Tempo brasileiro. Rio de Janeiro: n. 92/93 (jan/jun), 1988b, p.62-82

GROSFOGUEL, Ramón. A estrutura do conhecimento nas universidades ocidentalizadas: racismo/sexismo epistêmico e os quatro genocídios/epistemicídios do longo século XVI. In: Revista Sociedade e Estado, v. 31, n. 1, 2016.

HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. In: Cadernos Pagu, Campinas: n. 5, 2005, p. 7-41.

HEATHFILED, Adrian. Alive: (AO) VIVO. Performatus, n.9, p.1-21, 2014.

JONES, Amelia. Body Art/Performing the Subject. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998.

___________. The Artist is present: Artistic Re-enactments and the impossibility of presence. TDR/The Drama Review, Nova Iorque, v. 55, n.1, 2011, p. 16- 45.

________________. Presença in Absentia: a experiência da performance como documentação. In: eRevista Performatus, Inhumas, ano , n. 6, set. 2013.

MARTÍ, José. Nuestra América. Disponível em: http://www.josemarti.cu/publicacion/nuestra-america-2/ Acesso em 15 de out 2018.

MINH-HÁ, Trinh T. Não pare no escuro (declaração da artista). In: O cinema de Trinh T. Min-há. Catálogo lançado pela Caixa Cultural na mostra de cinema de Min-há, 2015, p. 21-28.

MIGNOLO, Walter D. La idea de America Latina: La herida colonial y la opción decolonial. Barcelona: Editorial Gedisa, 2007.

PALLADINI, Giulia. The making of our lexicon. In: Lexicon for an Affective Archive. Chicago: University of Chicago Press, 2017.

PHELAN, Peggy. A ontologia da performance: representação sem produção, Revista de Comunicação e Linguagens, trad. André Lepecki, nº 24, 1993, p.171-191.

ROLNIK, Suely. Arquivomania. In: Na borda – nove coletivos, uma cidade. Governo do Estado de São Paulo, Secretaria da cultura, Programa de Ação Cultural 2011, p. 19-43.

Publicado
2019-05-08
Seção
Estudos da Performance