Poéticas da negação: lugares de encontro pelo avesso

  • Lívia Flores Lopes

Resumo

“Poéticas da negação: lugares de encontro pelo avesso” aborda aberturas para
a teatralidade implícitas em episódios de questionamento da imagem no campo
das artes visuais. A argumentação se constrói a partir da discussão de
elementos comuns às obras de Marcel Duchamp, Yves Klein e Tino Sehgal. Ao
problematizar a imagem da arte, estes artistas deslocam o foco da
contemplação da obra de arte para a cena na qual o espectador se insere com
absoluta centralidade. Das vanguardas históricas aos nossos dias, o fio
condutor que reúne os três artistas atravessa quase um século de
experimentações em torno da posição do espectador. Este é o ponto nodal que
nos obriga a uma reflexão tanto sobre o processo de teatralização da arte
contemporânea quanto a possíveis reverberações no campo do teatro pósdramático
e da performance. Quando uma forma já cristalizada se rompe,
ocorre um intenso fluxo de contaminações entre seus estilhaços, gerando
formas inéditas e novas questões. Todo gesto iconoclasta, seja ele de natureza
religiosa ou artística, ao atacar o vínculo que supõe existir entre forma material
e substância imaterial abre um amplo feixe de relações, que se irradia em
múltiplas direções. Mas à diferença da iconoclastia religiosa, que serve para
reafirmar certezas e parâmetros de fé, atos iconoclastas em arte parecem
contribuir para estender os limites do que acreditamos poder chamar de arte.
Considerando intrinsecamente teatral o próprio gesto iconoclasta, o que muda
é o sentido do ataque à imagem, que pode adquirir conotações de recusa,
suspensão ou simples ausência. Isto nos leva a diferentes poéticas da negação.
Desde os gregos entende-se por poética o processo de fabricação humana que
faz passar à existência algo que antes não havia no mundo. Mas o que
acontece quando esse sentido se inverte e algo trabalha para deixar de ser?
Acreditamos que muito do que durante décadas se especulou em torno do
tema “morte da arte” pode hoje ser percebido como trabalho de reconfiguração
do que se entende por arte. Cabe a nós, contemporâneos, estabelecer
encontros produtivos entre áreas por vezes engessadas em suas
especificidades pelas histórias da arte e do espetáculo.

Referências

BOIS, Yve-Alain. L’actualité de Klein; CABAÑAS, Kaira Marie. Yves Klein en

France: un paradoxe spatial; RIOUT, Denys. Imprégnations: scénarios et

scénographies in cat. Yves Klein:corps, couleur, immatériel. Paris: Centre

Georges Pompidou, 2006.

DE DUVE, Thierry. Resonances du readymade. Nîmes: Éditions. Jacqueline

Chambon, 1989.

FLORES LOPES, Livia. Como fazer cinema sem filme? Tese de doutorado.

Rio de Janeiro: EBA-UFRJ, 2007.

GRIFFIN, Tim. “Tino Sehgal an interview” in Artforum International: New

York, may 2005.

MICHAUD, Philippe-Alain. Le peuple des images, Essai d’anthropologie

figurative. Paris: Desclée de Brouwer, 2002.

MONDZAIN, Marie José. L’image peut-elle tuer? Bayard: Paris, 2002.

SEHGAL, Tino. Fondazione Nicola Trussardi, 2008. Acesso em 9.8.2011.

< http://www.fondazionenicolatrussardi.com/exhibitions/tino_sehgal>.