O trágico e a contemporaneidade

  • Carmem Gadelha

Resumo

São dois os aspectos fundamentais do modelo grego de tragédia — a política e
a relação com os mitos. Há que verificar as condições contemporâneas para os
desempenhos desses elementos. A pós-modernidade encena uma
subjetividade descentrada; isto abala as noções de corpo próprio, social e
coletivo. O capitalismo global precariza o trabalho, estabelecendo novos modos
de produção material e simbólica. A pesquisa verifica a circulação da
tragicidade em sua potência mesma, na derrocada da ação teatral do
personagem. É imperativo examinar trajetórias de tempo e espaço: suportes
conceituais e materiais para as narratividades. O trabalho se baseia em leitura
da bibliografia sobre a tradição, a modernidade e a contemporaneidade. A
frequência a espetáculos permite mapear a situação atual através de estudos
de caso. Tais observações alcançam a performance. Modernidade e pósmodernidade
têm, quanto a tempo e espaço, as contribuições de Wagner e a
obra de arte total, de um lado; de outro, a desmontagem da representação por
Artaud. O trágico é enfeixado, dos gregos até nós, pelo projeto humanista —
nascimento e derrocada, utopias e heranças atuais. Trabalho em andamento,
os resultados e as conclusões são provisórias, situadas pouco além das
hipóteses levantadas. Premissa: a tragédia grega surge do choque entre o
arcaico e as novas inscrições da polis no tempo histórico (tradição versus
exigências do presente). A segunda premissa estabelece o conflito como
condição da tragicidade, mesmo que o gênero tragédia esteja ausente. Em
terceiro lugar, temos, no atual desfazer-se da ação teatral, elementos ativos
que permitem identificar processos trágicos. Segue-se o principal problema: a
laminação de tempos fragmentados, os presentes superpostos e contíguos,
que mal admitem a permanência do trágico. Resta seguir a trilha das inscrições
históricas (instauração de um tempo espesso) efetivadas pelos movimentos
sociais. Daí a reinvenção do trágico e suas possibilidades de verificação:
figurações e reinvenções de formas da narratividade e do espetáculo teatral.

Referências

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