A Propósito de uma Leitura Dramática

  • Sara Rojo de la Rosa

Resumo

O Mayombe Grupo Teatro fez uma leitura dramática de “Lágrimas de um
guarda-chuva”, de Eid Ribeiro, no dia 8 de junho de 2011. O processo de
construção desse trabalho foi governado pelo desejo. Desejo de fazer, de criar,
de compartilhar propostas e, como sempre, uma luta contra o relógio de cada
um. Por que isso é possível? O texto de Eid convoca e, além disso, existe o
desejo, no grupo, de quebrar com o tempo linear para transformar a
experiência num instante de “prazer”, corporificar a literatura sem que deixe de
ser literatura. Criar outros formatos para fazer e para falar da arte. Em relação
ao texto, do título até a última fala, consiste, principalmente, num jogo em que o
que está colocado em questão é a função da arte numa sociedade na qual esta
perdeu seu lugar. Digo, principalmente, porque não se pode esquecer que a
ação dramática coloca no palco seres que nasceram ou que foram jogados
numa estrada sem cidadania. São corpos à deriva, nos quais o que prima são
os instintos de vida/ sexo, morte/ sobrevida. Dentro desse universo, o corpo é
entendido como passível de ser morto, estuprado, usado. Tudo isso, dentro de
uma estética que brinca com o grotesco e com o riso diante da inumanidade. A
peça dói, porque se testemunha esse mundo e não se pode fazer nada ou
quase nada, senão fugir como a protagonista Zambê, a mulher-macaco. Neste
século XXI, grande parte da arte foge dessa realidade e se refugia num debate
intimista ou supostamente subversivo a convenções e cânones sem nenhuma
reflexão sobre os jogos de poder, de destruição e de animalidade que estamos
vivendo. As peças de Eid são diferentes: mergulham dentro do sujeito para
olhar a sociedade. As imagens que nascem de seus textos “tomam posição”,
mas uma posição que não esquece a linguagem metafórica e passional da
arte. Mesmo que seja, como no caso de “Lágrimas de um guarda-chuva”, para
mostrar um mago (artista) que já não tem truques para envolver um povo
contaminado pela peste, fazendo que essa imagem reflita como espelho os
artistas do presente, desolados, tentando retirar coelhos da cartola para ver se
alguém volta a sentir com os velhos/ novos truques.

Referências

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RIBEIRO, Eid (autor) e Mayombe Grupo Teatro (leitura dramática). Lágrimas de um guarda-chuva. Belo Horizonte: Esquyna. Espaço Coletivo Teatral gerenciado pelos grupos Mayombe e Invertido, 8 de junho de 2011.

SAFATLE, Vladimir. “Materialismo, imanência e política. Sobre a teoria da

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